sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Uma questão moral



No mundo em que vivemos deixou, na verdade, de haver margem para grandes alternativas políticas. A experiência portuguesa é sintomática. Governados pelo PS ou pelo PSD-CDS, os portugueses sabem que, para além da retórica e da propaganda, o que podem esperar de quem ocupe o poder é o mesmo. A mesma política, os mesmos objectivos e os mesmos resultados. Os portugueses também sabem outra coisa. Sabem que votar à esquerda do PS, isto é, no PCP e BE, para além do voto de protesto, de pouco servirá. Pressentem, não sem razão, que um governo de esquerda, nas condições específicas em que o país e o mundo vivem, conduziria ao isolamento e a uma situação – mesmo que mais digna moralmente – económica e social ainda mais depressiva.

Na verdade, aquilo que é o sentimento geral não deixa de ter fundamento: não há alternativas pois o nosso destino (e isto não tem a ver apenas com o défice) não está nem estará, nos tempos mais próximos, nas nossas mãos. No entanto, há uma questão moral que merece ser pensada. Eu sei que política e moral não são a mesma coisa. Mas, apesar disso, a questão moral terá sempre de assombrar as práticas políticas da governação.

É provável que Portugal não tenha outra alternativa que não seja seguir o diktat dos representantes dos credores (vulgo a troika). São as consequências desse diktat que é preciso esclarecer. E estas são simples: um empobrecimento radical da maioria dos portugueses, a destruição da frágil classe média nacional, o retorno à emigração, condições de trabalho a roçar a escravatura (piores do que no tempo de Marcello Caetano), desemprego em massa e sem fim à vista, cuidados de saúde drasticamente piores e, como consequência, a morte cada vez mais cedo, serviços de educação cada vez piores e protectores das elites sociais. Estas são as consequências daquilo que a troika exige e que toda gente sabia e conhecia.

Mas uma coisa é fazer o que tem de se fazer por não haver alternativa, outra é fazê-la por gosto e programa ideológico. E este governo – de uma incompetência atroz, como se verifica pelo falhanço no défice – faz esta política por prazer fundado na sua ideologia. É isto o que significa dizer que se quer ir além da troika. Esta expressão é uma confissão da natureza daqueles que nos governam. Ir para além da troika é aumentar sem pudor o conjunto de sofrimentos que caem sobre os portugueses. Não qualifico sequer a qualidade moral de quem nos governa e quer ir além das exigências troika. As pessoas encontrarão por si mesmas os epítetos adequados a esta gente.

2 comentários:

  1. Boa noite,
    O respeito e consideração intelectual que tenho pelo JCM e pelo seu blogue, impedem-me os epítetos que gostaria de proferir.
    Concordo em parte com o que escreveu. De facto, estamos sitiados por este diktat troikista e não só.
    Mas aindaassim, acredito que uma solução à esquerda será possível, desde que exista a coragem de mudar no partido-chave, ou seja no PS, e fazer acordos com todas as forças que estão interessadas em inverter este descalabro imoral e obsceno.
    Tenha um bom fim-de-semana.
    Um abraço

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    1. Só duas coisas. Não acredito que o PS possa mudar. Ele está comprometido com uma narrativa acerca do mundo e nada há fazer. Em segundo lugar, se por um milagre o PS voltasse à esquerda, um governo de esquerda que não fosse imoral seria imediatamente condenado pelos mercados e Portugal seria isolado. O Brasil pode fazer uma política menos imoral, pois tem recursos para isso e porque está a criar um mercado mais largo. Nós não temos uma coisa bem outra. Enfim, estamos metidos num grande sarilho.

      Um bom fim-de-semana.

      Abraço

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