quinta-feira, 8 de agosto de 2013

A pior das ideias

Francisco Bayeu y Subías - Gloria del Espíritu Santo (1778)

Tudo quanto provém do espírito é superior ao que existe na natureza. A pior das ideias que perpasse pelo espírito de um homem, é melhor e mais elevada do que uma grandiosa produção da natureza - justamente porque essa ideia participa do espírito, porque o espiritual é superior ao natural. (Hegel, Estética)

Desligue-se a citação da generalidade da filosofia hegeliana e detenhamo-nos na superioridade da pior das ideias sobre qualquer, por grandiosa que seja, produção natural. Aqui encontramos a essência do projecto da modernidade: refazer a natureza segundo as ideias do espírito humano. Por pior que sejam essas ideias elas têm uma legitimidade que a natureza, nas suas produções espontâneas, não tem. Hegel escreve isto nos anos vinte do século XIX. Transportemos estas palavras para a experiência que nós, homens do século XXI, temos da história. De um momento para o outro, pressentimos que tudo está legitimado e justificado. As piores ideias, as mais nefastas, as mais odiosas encontram aqui a sua razão. A modernidade não é apenas a época onde o movimento, a mobilidade e a mobilização estruturam a vida dos homens. Ela é a era onde a natureza, devorada pelo espírito, deixou de ser um valor em si. A pior das ideias é melhor do que uma grandiosa produção da natureza. Talvez nesta formulação possamos encontrar a chave para o enigma dos nossos tempos.

6 comentários:

  1. O burguês e intelectual Aschenbach, em Morte em Veneza, também se interrogava sobre A Ideia, o Espírito, e a grandiosa produção da Natureza, não era? Creio que nunca li um texto seu sobre Morte em Veneza, um dos livros mais belos e difíceis de entender de sempre. Nunca se interessou?

    Parabéns pelo seu texto.

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    1. Muito obrigado, Maria. Na verdade nunca escrevi sobre A Morte em Veneza, de Thomas Mann. Estes livros sobre os quais vou escrevendo são leituras ou releituras recentes. A Morte em Veneza já o li há muitos anos e não retornei a ele. Quando isso acontecer, então escreverei sobre.

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  2. De nada...

    Sim, volte a lê-lo e escreva...Li-o várias vezes ao longo dos anos e deparo-me sempre com qualquer coisa mais. Recentemente voltei a ver o filme de Visconti, mais uma vez um deslumbramento também.

    Aguardaremos com gosto e paciência que nos escreva qualquer coisa sobre o livro...Bem haja.

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    1. Um dia destes voltarei ao livro, mas de Thomas Mann tenho outros retornos agendados com mais prioridade, a Montanha Mágica (na nova tradução) e o Doutor Fausto, livros de que gostei muito. Depois, a Morte em Veneza. Talvez escreva antes sobre o filme do Visconti. Veremos.

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  3. Creio que não tenho capacidade para subscrever a ideia, porque penso que a Natureza só ataca o Espírito quando este a provoca.

    Abraço

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    1. E este, nos último tempos, tem-lhe feito muitas provocações.

      Abraço

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