quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A transfiguração da pátria (3) O silêncio da noite

Mon Montoya - Objectos na noite, sombras (1999)

Removo a poeira que oculta a luz
e deixo fermentar as imagens
que trago no fundo do corpo.
São restos do mundo que amei,
os velhos pinheiros agora ardidos,
campos onde o sol descia entre águas,
alguma memória na orla da floresta.

Faço de tudo isso um pequeno manual,
irónica recordação do tempo
em que os castelos cobriam a paisagem
e de lá avistava o inimigo.
Depois, componho nas margens do Tejo
um longo hino e medito na queda
que assombra o silêncio da noite.

As praias morrem de turistas
e as cidades, reminiscências de um amor,
cantam um requiem pelos dias felizes.
O mal chega sob a figura do futuro
e uma lepra azeda infesta as mãos,
traça runas pelas paredes,
a sombra da minha sombra ao partir.

2 comentários:

  1. Também me doem as cinzas que escondem a beleza das veredas do Tejo, apenas não sei transformá-las em poesia.
    Mais um belo poema.
    Abraço

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