quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Meditações dialécticas (16) A razão ficcional

Jean-Baptiste Greuze - Portrait of Marquis de Condorcet (séc. XVIII)

Condorcet foi um dos grandes matemáticos de todas as épocas, um dos criadores do cálculo diferencial, e a primeira pessoa a tentar predizer, pelo uso da matemática, os possíveis resultados da tomada de decisão humana, o que faz dele o antepassado da moderna ciência política. (Anthony Padgen, The Enlightenmente and why it still matters)

Pensa-se muitas vezes que entre o pensamento mítico e o pensamento racional há uma diferença absoluta, que a razão obedece a regras e parâmetros muito diferentes daqueles que animaram os saberes tradicionais da humanidade. Se Condorcet, na história da cultura ocidental, tem um peso nunca suficientemente sublinhado, esse peso liga-se ao triunfo do Iluminismo e das ideias racionalistas que, na sequência do triunfo da filosofia moderna e do nascimento da nova ciência, se apoderaram do panorama cultural da Europa ocidental. 

Ora se a previsão das consequências das decisões humanas, baseada no uso da matemática, faz de Condorcet o antepassado da moderna ciência política, o impulso para penetrar no futuro torna-o descendente de Tirésias, de Cassandra, dos profetas do Antigo Testamento. Sob a capa da razão - e da razão matemática - esconde-se sempre um impulso mítico, uma ficção produzida pela imaginação. A razão surge, deste modo, como um processo de racionalização e abstracção, mas que, pela sua própria origem, não deixa de ter uma natureza ficcional.

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