quinta-feira, 12 de junho de 2014

Uma Igreja à espera que passe

Francesca Woodman - Untitled, Providence, Rhode Island (1975)

José Mattoso, Frei Bento Domingues, Ruy Vieira Nery, Isabel Allegro Magalhães, Jorge Wemans, António Marujo, entre outros, assinam um documento dirigido à reitoria da Universidade Católica Portuguesa, onde mostram a sua indignação pela atribuição do prémio Fé e Liberdade a Alexandre Soares dos Santos, ex-presidente do Grupo Soares dos Santos (ver Diário de Notícias). Não vale a pena repetir aqui as interrogações dos signatários, o leitor pode lê-las no jornal. Queria sublinhar um outro aspecto. Este prémio choca com o discurso papal e com a referência à Igreja dos pobres. O Papa Francisco parece completamente desadequado em relação a uma parte da sua Igreja. Como todos sabemos, a Universidade Católica (UCP) não é um lugar frequentável por pobres. Já quanto aos ricos e aos que gostavam de o ser, não há nenhum que não queira lá educar os filhos. Este prémio, por muito que isso indigne alguns ilustres católicos, está de acordo com o tipo de Igreja que a UCP representa. É nela que se ensina, por mais que o Papa o verbere, o capitalismo ultraliberal que gera uma sociedade que torna os homens coisas descartáveis, que os conduz à morte. Em Portugal, mas não só, uma parte da Igreja apenas está à espera que o mau tempo passe, isto é, que este Papa, com o seu discurso fundado num certo franciscanismo, desapareça e a boa consciência dos ricos seja, de novo, matéria de justificação papal.

4 comentários:

  1. O dedo na ferida. É óbvio que, já que falamos de "empreendedores", como eles gostam de dizer,
    não poderíamos imaginar que a UCP atribuísse o prémio, por exemplo, a Rui Nabeiro.
    Abraço

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    1. Empreendedor e, já agora, colaborador tornaram-se palavras odiosas, pelo uso ideológico que delas é feito. Utilizam-nas como quem arremessa uma pedra à cabeça do próximo.

      Abraço

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  2. O Orwell percebeu, como ninguém, que a ideologia começa sorreitarmente na linguagem. E se é aí que começa é também por aí que a resistência (no seu pleno sentido histórico-francês) deve começar, denunciando o sentido latente por detrás do sentido manifesto. Eu já fui tratado por "colaborador" em vez de "professor". Um nojo a roçar a mais pura abjecção.

    JR

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    1. Pois. Na minha escola, uma empresa de avaliação fazia reuniões gerais onde os alunos eram clientes. Não sei se me chegaram a chamar colaborador, porque, a partir da segunda idiotice, desligo e finjo apenas que estou a ouvir. O pior, porém, é que somos nós que começamos a ficar desadequados.

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