sexta-feira, 11 de setembro de 2015

O terrível peso do passado


A actual pré-campanha eleitoral parece um estranho episódio neo-realista. Talvez isto não seja uma especificidade portuguesa. Talvez todas as campanhas eleitorais tenham uma natureza neo-realista devido à clivagem entre direita e esquerda. Este cenário neo-realista é o retrato impiedoso de um país atado de pés e mãos pela sua própria economia e pela impotência do Estado em mobilizar a comunidade para alterar a situação.

O grande problema de Portugal talvez não seja político nem financeiro. Talvez seja económico e prende-se com a desadequação de grande parte das empresas (empresários e trabalhadores) às exigências de um mercado global e à necessidade constante, para poder sobreviver num clima muito competitivo, de se reinventar continuamente produtos, técnicas e organizações. O drama de muitas empresas é que são dirigidas por pessoas mais adequadas ao século XIX do que ao XXI. A tragédia de muitos desempregados é a sua desadequação tecnológica. O peso do passado é terrível.

Houve dois governantes que perceberam o cerne do problema. Guterres e Sócrates. Perceberam que o triângulo Educação – Tecnologia – Ciência era o motor da reversão da situação. Deste triângulo, devido à inteligência e à persistência de Mariano Gago, Portugal deu passos decisivos, agora em vias de destruição, nas áreas da ciência e da tecnologia. A grande falência – para além da dificuldade de fazer penetrar o conhecimento e a inovação tecnológica no tecido empresarial – foi a educação. Desde a visão romântica de Guterres aos devaneios tecnológicos de Sócrates falhou-se o essencial: a construção de uma escola pública de grande qualidade e adequada às exigências do mundo de hoje. Também a escola portuguesa continua mais perto do século XIX do que do XXI. Também aqui o peso do passado é terrível.

A educação e a formação são as chaves para abrir alguma possibilidade de futuro para o país. Elas só funcionam, contudo, se o investimento público na área for pensado tendo em conta o país que existe (e não o que se inventa) e se for acompanhado por uma exigência rigorosa na vida escolar e na formação. O problema é que o peso do passado impede de olhar a situação. A direita a única coisa que pensa é destruir o ensino público, fiel a um antigo sonho de entregar as escolas a supostos empresários da educação. Os socialistas, presos à sombra das paixões de Guterres e dos devaneios de Sócrates, pouco mais têm a dizer sobre a matéria. Os outros, seja o que for que digam, não contam. Em vez de pensarmos rigorosamente o futuro, continuaremos presos ao neo-realismo que alimenta direita e esquerda. Terrível o peso do passado.

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