quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Experiências de invisibilidade

René Magritte - As Férias de Hegel (1958)

Portugal é um país difícil, embora semi-ameno e, apesar das aparências, semi-amável, e isto é já ser tolerante. Quanto aos portugueses, estes têm dias. Às vezes, possuem o dom de fazerem poucas conexões neuronais. Também consta que possuímos o QI médio mais baixo da Europa Ocidental. Basta chegar a Badajoz e o QI sobe, por milagre, três pontos. Quando me sinto irritado – coisa que acontece mais do que devia – com o pouco uso que a variante portuguesa do homo sapiens sapiens faz das estimáveis conexões neuronais lembro-me sempre de uma ocorrência passada, há uns anos, num daqueles restaurantes de referência, garfo de ouro, à época, do Expresso.

Chegámos e entrámos para uma sala onde havia apenas outro casal. Fomos sentados numa mesa suficientemente longe desses comensais. Passado pouco tempo, ficámos sozinhos. Até que chega um novo casal, gente cinquentona como nós, acompanhado pela mãe dele. Falavam alto e nasalavam as palavras, marido e mulher por pouco não se tratavam por tio e tia. Evidenciavam uma boa instalação na vida e a frequência dos sítios certos. A mãe dele olhava para a nora com a habitual condescendência que se tem quando se acredita que os filhos não souberam escolher a mulher. O empregado teve a infeliz ideia de dizer “podem escolher, estejam à vontade” (foi aqui que eu comecei a desconfiar dos garfos de ouro).

Ora há um princípio essencial na vida em Portugal: um português nunca deve ser deixado à vontade. Entre as múltiplas mesas existentes na sala vazia, a única que interessou a estes extraordinários portugueses deixados à vontade foi a contígua à nossa, ali mesmo a uns escassos 50 a 70 cm do meu prato. A esta primeira amabilidade, que me fez acreditar possuir o poder da invisibilidade, acrescentaram, perante o silêncio constrangido em que tomámos a refeição, ainda as suas ruidosas opiniões sobre isto e aquilo e até sobre uma pessoa que, por acaso, conhecíamos muito bem de outras e longínquas paragens. Por vezes, penso que sofremos de um défice de qualquer coisa, ou de um superavit de estupidez. Não, não, nem sempre é fácil a vida em Portugal.

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