quinta-feira, 28 de abril de 2016

Celibatários e comunismo

Albert Porta - Dorud Communism Collapse (1991-92)

Excepção feita de uma ou outra associação de celibatários, a história das tentativas comunistas apenas regista dissolução e ruínas. (Herbert Spencer (1891), Da Liberdade à Escravidão)

A frase citada de Herbert Spencer sobre a história das tentativas comunistas sempre me fascinou. Não porque o século XX tenha confirmado, de forma dolorosa e inequívoca, o acerto da análise de Spencer. O que me fascina é ideia de que há excepções a essa constatação geral do fracasso do comunismo. Isto não significa que eu julgue que o comunismo, enquanto forma de sociedade, seja possível. Diga-se de passagem que uma autora, prémio Nobel, como Svetlana Alexievich, que não poderá ser rotulada de amante do comunismo, profetizou há pouco o retorno do comunismo, agora, porém, num país rico. Duvido, mas voltemos ao que há de fascinante na frase de Herbert Spencer.

A excepção ao fracasso do comunismo residirá, segundo o pensador britânico, numas quantas associações de celibatários. O fascinante reside, assim, no facto de o comunismo só ser possível numa associação daqueles que se recusam a uma certa associação, isto é, ao casamento. A frase de Spencer não é uma mero dito espirituoso um pouco mal intencionado. É uma crítica subtil e devastadora das concepções comunistas da sociedade. Diz que entre elas e a vida em família há um conflito insanável. Facilmente se perceberá porquê. Se estou disposto a abdicar de ter uma família, também posso dispor-me a renunciar à propriedade. É um problema meu. No momento, porém, que se coloca o problema da família, eu já não penso em mim, mas na família, no interesse dos filhos. Aí cessa o direito moral de renunciar à propriedade.

Em tudo isto há, porém, uma ironia. O comunismo, tomado como forma suprema de altruísmo, só seria possível por uma acto de renúncia egoísta à partilha da vida com outra pessoa. Por seu turno, o egoísmo que conduz os seres humanos à defesa da propriedade privada assenta num gesto de renúncia ao seu próprio egoísmo em nome da pequena comunidade que é a família. É a tensão perante o destino da família que levará os adultos a lutarem contra a ruína e a dissolução que ameaça a cada instante a vida dos homens. A não compreensão disto, do peso inultrapassável que a defesa das novas gerações tem para os adultos, está na base dos fracassos de todas as experiências comunistas conhecidas até hoje.

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