quinta-feira, 7 de abril de 2016

Republicanismo da bofetada


O Ministro da Cultura, João Soares, achou por bem derramar a sua ira com os críticos e ameaçar distribuir umas "salutares bofetadas" por Augusto M. Seabra e Vasco Pulido Valente. É irrelevante discutir o mérito dos textos que desencadearam a reacção de Soares. Li ambos (ver aqui o de VPV e aqui o de AMS). Pelo menos o de Seabra é um texto crítico pertinente e merece ser lido com atenção. Isso, como disse, porém, é o que menos importa. O que importa é tentar compreender a etiologia do tique autoritário do ministro. Podemos sempre olhar para a questão do ponto de vista individual. A reacção deveu-se a uma idiossincrasia de João Soares. Certamente, será isso que o PS irá fazer. 

Seria bom, contudo, que os socialistas olhassem para si próprios e tentassem perceber se este tique autoritário - que se manifestou, embora de outros modos, em situações anteriores - não está inscrito no próprio ADN do PS. Contrariamente aos partidos socialistas, sociais-democratas e trabalhistas europeus, cuja origem se encontra nos movimentos operários e no reformismo social do século XIX e do início do século XX, o PS português tem a sua origem na burguesia radical que fez a primeira República e cujos tiques autoritários são sobejamente conhecidos. 

São estes tiques hereditários que, aqui e ali, com mais ou menos veemência, se manifestam com os resultados que vimos com o socratismo e nos comentários disparatados de Soares. O PS não pode querer ser ao mesmo tempo o campeão das liberdades, epíteto com que gosta de se apresentar, e ameaçar essas mesmas liberdades, como sucedeu neste triste episódio. Soares tem idade suficiente para perceber que não vivemos no século XIX nem nos anos conturbados da República. Na verdade, só há uma saída limpa para o actual Ministro da Cultura, a demissão.

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