quarta-feira, 1 de junho de 2016

Escola pública

Juan Botas - School (1989)

A minha crónica de Maio em A Barca.

O braço-de-ferro entre o governo e os colégios privados que beneficiam de contratos de associação tem várias nuances, algumas das quais não estão a ser devidamente equacionadas. É verdade que, do ponto de vista do interesse público, não se percebe por que motivo, contrariando a Lei de Bases do Sistema Educativo, deve o Estado financiar escolas privadas quando, na sua zona, existem escolas públicas. É evidente que aquilo que o anterior governo fez, abrir esse financiamento a colégios onde existe oferta pública, tinha um claro objectivo político de desvalorizar as escolas estatais e, paulatinamente, entregar os dinheiros públicos a entidades privadas, enquanto deixava morrer o sistema público de ensino.

O principal problema, porém, vem de outro lugar e de uma ideia que está a ser passada com muita eficácia para a opinião pública. Em situações de igualdade de custos, as pessoas preferem, para educar os seus filhos, os colégios privados às escolas públicas. Estão convictas – e pouco importa que isso corresponda à verdade – que os colégios privados fornecem uma melhor educação do que a escola pública. Esta ideia vem fazendo o seu caminho há longos anos, tem um lobby poderoso e persistente por trás, muitos políticos e comentadores comprometidos com ela. Mesmo que não corresponda à verdade (e não corresponde), mesmo que o governo ganhe este conflito, a escola pública perdeu nestas últimas semanas. Quem observa a política, compreende que, num futuro retorno da direita ao poder, a escola pública será trucidada. Ficará apenas para aqueles que os colégios privados rejeitarem.

Temo que a esquerda preocupada com os contratos de associação não perceba o que está em jogo. E o que está em jogo é a defesa da qualidade na escola pública. Isso não se faz pondo fim a exames, inventando tutorias, e aumentando, mais uma vez, os controlos burocráticos da escola, que é o que está prestes a acontecer. É preciso olhar para a realidade e para aquilo que está a degradar a imagem da escola pública. Não basta a retórica da escola inclusiva. Que fazer com os alunos que sistematicamente boicotam as actividades lectivas e que a escola pública não pode pôr fora? Como resolver esse problema? Como dinamizar novas práticas lectivas e formas de aprendizagem, se tudo está pensado – desde o controlo central das escolas até à complacência na formação e recrutamento de professores, passando pelas salas de aula e organização das escolas – para se ensinar como no seculo XIX? Defender a escola pública passa, em primeiro lugar, por responder a estas perguntas desagradáveis. Espero o pior.

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