segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Alma Pátria - 13: Carlos Ramos - Não Venhas Tarde



Não consegui encontrar a data de criação deste fado cantado por Carlos Ramos. Também não sei se a capa apresentada pertence à gravação original. Descobri apenas que ela diz respeito a um disco de 1964, um EP com o título Mas sou fadista. Carlos Ramos faz parte de um trio de vozes masculinas interessantes, que deviam estar no auge na altura em que nasci, em meados dos anos cinquenta. Para além de Ramos, refiro-me a Max e a Alfredo Marceneiro. Isto é uma cultura popular que me é radicalmente estranha. Este Não Venhas Tarde é um retrato social do país que então éramos. Não me refiro à infidelidade, pois essa é, como o amor, eterna. Refiro-me ao tipo de relação homem mulher subjacente ao texto. O homem cindido entre o puro amor e o desejo erótico, cada um deles representado por um tipo de mulher, como se a sua coincidência numa única fosse impossível. Esta ideologia – a da mulher pura, esposa e mãe, e a outra, a dos prazeres eróticos – era também subjacente ao regime político que se vivia na altura. Eros é um deus brincalhão de humor instável, o que não se coadunava com a imagem que o solitário presidente do Conselho gostava de vender para consumo público. Não estou a dizer que foi o regime que a produziu. Diria até o contrário: é este tipo de ideologia social que acaba por permitir e mesmo requerer o tipo de regime que se vivia então. Dito isto, repito, Carlos Ramos tinha uma voz assinalável.

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